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31.01.16

A COMISSÃO EUROPEIA A PREPARAR UMA NOVA CRISE – 7. UNIÃO EUROPEIA DOS MERCADOS DE CAPITAL: UM NOVO CAMPO DE MINAS – OS ECONOMISTAS NÃO SÃO TODOS UNS PATIFES – por BERNARD MARX – II


antonio garrochinho

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

logo - regards
Comissão Europeiacrise - XVIII

Bernard Marx, Union européenne des marchés de capitaux: un nouveau champ de mines

Regards.fr, 10 Nov 2015 

(conclusão)

E os vencedores são?

O facto de o plano não permitir uma unificação efectiva do mercado europeu de capital  não quer dizer que impedirá a tendência ao dumping regulamentar e à concentração dos negócios   nas praças  financeiras “mais atractivas”, a começar pela City de Londres.

Do resto, este projecto é conduzido  pelo Comissário britânico Lord Hill, antigo lobista da  City. Embora não participe na União bancária europeia, o Reino Unido contaria participar na  União dos mercados de capital  e obter as vantagens daí resultantes para a City.

“O Reino Unido será um dos principais beneficiários do plano da Comissão europeia para a união dos mercados de capital”, sublinha William Wright, fundador de um think tank  dedicado  à promoção dos mercados de capitais europeus. “Politicamente, acrescenta, a união dos mercados de capital – a peça soberana do Comissário britânico Lord Hill – mostra como o Reino Unido pode influenciar as políticas em  Bruxelas de acordo com o seu interesse económico nacional. E,  de forma velada, sugere a vontade aparente da União Europeia de  satisfazer as pretensões  britânicas sobre às questões  mais sensíveis das suas relações com o resto da Europa.” Resumidamente, na sua configuração actual, a União dos mercados de capital  aparece muito como sendo um   presente feito ao governo Cameron na perspectiva do referendo britânico sobre a manutenção do Reino Unido na União Europeia.Quanto aos efeitos deletérios sobre as regulamentações  é suficiente ver como reagem as autoridades francesas. O lobby bancário e dos seguros disse: sim à União dos mercados de capital  e sim  à plena  participação dos bancos franceses. E para isso é necessário defender o modelo de banco universal e enterrar o projecto europeu de separação entre banco de retalho  e banco de investimento, mais restritivo  que a lei francesa de 2013. E é necessário renunciar ao projecto de taxas sobre as transacções financeiras de onze países. “Onze países em vinte e oito. Se se conseguir,  aumentará a fragmentação dos mercados e incitará a uma arbitragem entre praças  financeiras. Penalizará as condições de financiamento das empresas francesas e fragilizará a praça financeira  de Paris.” Paralelamente, banqueiros e seguradoras reclamam a redução das exigências de fundos próprios  no que diz respeito aos investimentos nas infra-estruturas e nos produtos de titularização.  Mensagem recebida cinco sobre cinco pelo governo que fez deste último ponto a prioridade francesa no âmbito do plano.

Titularização, o regresso

O objectivo de fazer evoluir o modelo de financiamento europeu para um modelo “à anglo-saxónica”, ou seja um sistema dominado mais pelos mercados do que pela intermediação de crédito, não data de hoje. “ Desde  2007, recorda Jean-Paul Pollin, professor de Economia na  universidade de Orléans, o BCE pretendia que a integração e a eficiência dos sistemas financeiros europeus seriam favorecidas por um desenvolvimento dos mercados de capitais. ” A questão  é retomada hoje em nome do argumento segundo o qual o regulamento bancário de acordo com crise teria sido sobrecarregado com pesadas  exigências de capital  dos bancos a um ponto tal que impediria o desenvolvimento dos créditos a  custo razoável para os mutuários. Com efeito trata-se essencialmente das PME e das empresas de dimensão intermédia (ETI), porque a desintermediação  do financiamento das grandes empresas já é realizado desde há  muito tempo. Dois mecanismos seriam visados: o financiamento directo sobre os mercados e a titularização  dos créditos concedidos  pelos bancos.

A ideia de um relançamento da titularização  é perigosa, sublinha Jean-Paul Pollin, porque o fenómeno foi um dos ingredientes essenciais da crise de 2007/2008. Poder‑se‑ia , certamente, na sua opinião,  proteger este tipo de produto. Mas isso  necessitaria designadamente, uma acção resoluta de regulamentação e de enquadramento do shadow banking  o que está fora de questão. .

Mas também é dito por este economista, uma ideia absurda porque o mercado dos créditos às PME titularizados é praticamente inexistente. “Mesmo nos EUA, o país do modelo sonhado, a titularização dos  empréstimos às PME é pequena e apoiada por garantias públicas”, explicam os economistas Daniela Gabor e Jakob Vestergaard, da rede Critical finance. Na Europa, a experiência da Alemanha que recentemente tentou  ajudar a emitir obrigações PME é negativa. Resultou uma vaga de incumprimentos e de  falências. “O objetivo da política pública, concluem eles, não deve ser a de reduzir a dependência das PME no que diz respeito aos empréstimos bancários, mas a de construir relações bancárias viáveis.” “A melhor maneira de facilitar o financiamento dos PME-ETI é sem dúvida restaurar a solidez do sistema bancário, sublinha, no mesmo sentido, Jean-Paul Pollin. Se for necessário ir além para melhorar o acesso aos créditos de certas empresas, é então possível utilizar circuitos privilegiados, favorecer o refinanciamento destes créditos junto do Banco central ou ainda atribuir-lhes garantias públicas. Mas, conclui, não se vê como é que a titularização  pode acrescentar alguma coisa neste domínio”.

Além disso, o financiamento em fundos próprios  de empresas nascentes ou em desenvolvimento como o do financiamento das infra-estruturas implicam problemas muito importantes. O primeiro tem pouco a ver com os bancos, e o segundo apela sobretudo mais a  uma reactivação das capacidades de investimentos públicos do que às  parcerias  público-privadas desequilibradas ou às  privatizações depredadoras.

Resumidamente, com a União dos mercados de capitais, é um novo campo de batalha particularmente minado que  a ser  aberto.

Bernard Marx, sítio Regards.fr, Union européenne des marchés de capitaux : un nouveau champ de mines. Texto disponível em:

http://www.regards.fr/economie/les-economistes-ne-sont-pas-tous/article/union-europeenne-des-marches-de
http://aviagemdosargonautas.net

31.01.16

A política já não é um clube de cavalheiros


antonio garrochinho



O Parlamento nunca esteve tão próximo da paridade. Mas ainda falta muito. Fotografia: Gerardo Santos / Global Imagens
O Parlamento nunca esteve tão próximo da paridade. Mas ainda falta muito. Fotografia: Gerardo Santos / Global Imagens

Pela primeira vez, um terço do Parlamento é ocupado por mulheres. Pode parecer pouco, mas Portugal faz parte de um grupo restrito de países

Quarta-feira, 1 de agosto. Pela primeira vez em Portugal, uma mulher assumia a tutela de um Ministério, cinco anos antes de se tornar na primeira (e única, até à data) primeira-ministra. A mulher era Maria de Lourdes Pintasilgo, o Ministério era o dos Assuntos Sociais e o ano era 1974. O contexto era o de um país onde só 25% do total de trabalhadores eram mulheres, das quais 86% eram solteiras.
42 anos depois, a lista de mulheres na política portuguesa não vai longa, mas vai maior do que nunca: pela primeira vez em quatro décadas de democracia, um terço dos lugares do Parlamento é ocupado por mulheres. Por esta hora, Marcelo Rebelo de Sousa é o Presidente da República eleito, mas foram Marisa Matias e Maria de Belém que fizeram história, ao protagonizar um momento inédito em Portugal: duas mulheres a candidatarem-se às presidenciais.
deputadas eleitas-03
O cenário político começou a mudar de forma mais notória quando foram impostas quotas de género. A Lei da Paridade estabelece que “as listas para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para as Autarquias Locais são compostas de modo a assegurar a representação mínima de 33% de cada um dos sexos”. A lei foi publicada em 2006 e começou a ser aplicada em 2009, mas só nas últimas eleições legislativas, em outubro de 2015, é que teve o efeito pretendido. Isto porque, mesmo que a quota tenha sido cumprida nas eleições anteriores, se as mulheres não eram cabeças de lista ou número dois, muitas vezes não chegaram a ser eleitas. Desta vez, 25% das cabeças de lista foram mulheres.Elza Pais, deputada socialista e antiga secretária de Estado da Igualdade, não tem dúvidas de que as quotas são a razão pela qual muitas mulheres não ficaram de fora do Parlamento. “Não sei se é o meu caso ou não. Nestes casos, não sabemos onde começam umas dinâmicas e acabam outras. Mas não tenho dúvida nenhuma de que, se não houvesse quotas, não havia tantas mulheres no Parlamento. A mudança ia sendo feita, mas não haveria tantas mulheres como hoje – e acho que há poucas”, diz ao Dinheiro Vivo.
Os 33% atuais podem parecer pouco, mas, neste campo, Portugal está na metade boa do mundo. Só há dois países com mais mulheres do que homens no Parlamento: Ruanda e Bolívia. Cuba está quase na igualdade plena, com 49% de mulheres. A partir daí, a percentagem de mulheres é de 44% para baixo, até aos 0% em países como o Qatar ou o Iémen. O Parlamento português é mais equilibrado do que os parlamentos de países como o Reino Unido, Austrália ou França, onde as mulheres não chegam a ocupar um terço dos lugares. Ao todo, só há 33 países no mundo onde pelo menos um terço dos deputados e deputadas são mulheres.
“Não basta ser mulher”

Manuela Tavares, da direção da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), lembra-se do momento em que Maria de Lourdes Pintasilgo concorreu às presidenciais de 1986. Foi Mário Soares quem venceu estas eleições, mas Pintasilgo ficou na história como a única mulher a candidatar-se a Presidente da República em Portugal, até agora. “Hoje, temos um leque muito importante de mulheres na política”, reconhece Manuela Tavares, que destaca o Bloco de Esquerda, liderado por Catarina Martins e onde as vozes mais ativas são de mulheres.
Mas “não basta que haja mulheres nos cargos de direção”, diz. É preciso ter em conta não só o seu “projeto político”, mas “o seu posicionamento em relação a outras mulheres da política”. E a verdade, considera a dirigente da UMAR, é que “muitas mulheres, quando estão na política, na sua necessidade de se impor perante os seus colegas homens (porque têm sempre de mostrar mais do que eles), esquecem outras mulheres. Deveriam ter uma atuação mais coletiva, no sentido de fazerem uma certa pressão para que outras, que ainda não estão na política, possam estar”.
E se a maior presença de mulheres na política “é um incentivo” a que a condição da mulher na sociedade mude, ainda há as que não lutam por estes direitos, critica. “Temos o exemplo das alterações que o PSD quis impor sobre a lei do aborto. Houve mulheres do PSD que votaram a favor destas alterações. Não basta ser mulher, é preciso perceber qual é o projeto político que trazem”, frisa, referindo-se à introdução, aprovada pela maioria PSD/CDS-PP na anterior legislatura, de taxas moderadoras na interrupção de gravidez.
Ainda assim, acredita a atual secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Catarina Marcelino, tem sido mais fácil influenciar as políticas públicas e a agenda política desde que há mais deputadas. “Sem dúvida que [o facto de haver] mais mulheres na decisão traz para a agenda política matérias que têm a ver com as suas vivências. Ser homem ou mulher influencia a vida das pessoas. As mulheres têm preocupações que têm a ver com o seu papel social”, diz, em entrevista ao Dinheiro Vivo. Ao mesmo tempo, há “um alargamento da preocupação com estas questões, em função daquilo que é o espectro político”, nota. “Antes, estas questões da igualdade eram muito da esquerda. Hoje, podemos dizer que não têm uma marca de esquerda ou de direita”. Exemplo disso, sublinha, foi a votação para a revogação da lei relativa ao pagamento de taxas moderadoras no aborto voluntário, na qual deputados e deputadas de direita votaram a favor. Leia a entrevista completa à secretária de Estado Catarina Marcelino.
A cronologia em baixo mostra os avanços que foram feitos na legislação que protege os direitos das mulheres. E mostra também várias tendências: um período rico em alterações legislativas, após o 25 de Abril, um período quase deserto de progressos, nas legislaturas Cavaco Silva e António Guterres, e um novo período importante, desde que foi publicada a Lei da Paridade.
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Por votar estão, ainda, os projetos de lei do PS, BE, PEV e PAN, que alargam o acesso à procriação medicamente assistida a todas as mulheres, independentemente da orientação sexual e estado civil. A iniciativa do BE vai mais longe e prevê a maternidade de substituição “a título excecional”, como é o caso de mulheres sem útero, por exemplo. Os diplomas deveriam ter sido votados em novembro do ano passado, mas acabaram por baixar à comissão parlamentar de Saúde, sem votação, por um período de 90 dias. A discussão destes projetos está, assim, agendada para fevereiro.
caminho da paridade
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O gráfico ao lado mostra a atual composição do Parlamento. Se tudo correr bem, Elza Pais acredita que estes números serão mais equilibrados num futuro próximo. “Tivemos recentemente uma ministra das Finanças, temos uma ministra da Justiça e uma ministra da Administração Interna, pastas tradicionalmente ocupadas por homens. As mulheres estão aí e estão aí em qualquer dossier”, afirma. No futuro, quando a Lei da Paridade for avaliada, defende que deve estabelecer-se um mínimo de 40% de mulheres no Parlamento. “Claro que o ideal seria os 50%”.E as medidas para a igualdade não vão ficar por aqui, nem vão limitar-se à política. No programa de Governo, o PS expressa a intenção de “promover o equilíbrio de género no patamar dos 33% nos cargos de direção para as empresas cotadas em bolsa, empresas do setor público e administração direta e indireta do Estado e demais pessoas coletivas públicas”. As novidades neste campo estão para “breve”, prometeu já a secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Catarina Marcelino.

https://www.dinheirovivo.pt/

31.01.16

NUNO TEOTÓNIO PEREIRA - O Arquitecto afectos e causas


antonio garrochinho




Nem nós, seres humanos, perdemos Nuno Teotónio Pereira, nem a Arquitectura perdeu o Arquitecto afectos e Causas que ele é. Na vida, também e sobretudo na vida humana, nada se perde, tudo se transforma e expande, ao tornar-se definitivamente invisível aos olhos dos que ainda não protagonizamos a nossa derradeira páscoa dentro da história. A Morte é a maior invenção da Vida que sucessivamente acontece, no instante da nossa concepção, como outros tantos big-bang e, desde então, nunca mais deixa de expandir-se, até para lá da história. A morte é condição sine qua non, para nos expandirmos ilimitamente Somos filhas, filhos de mulher. Daquela mulher concreta, única e irrepetível, que nos acolhe no seu seio-útero e nos alimenta, até ao momento do parto e para lá dele. A quem chamamos Mãe, exactamente, o mesmo nome de Deus que nunca ninguém viu, no lúcido testemunhar de Jesus, o filho de Maria, o ser humano pleno e integral (cf. todo o meu Livro Jesus Segundo João, o 4º Evangelho traduzido e anotado como nunca o conhecemos, Seda Publicações 2014).


Nenhum humano é, sem mãe. Sem mulher. Embora o BI de cada nascido de mulher continue a colocar em primeiro lugar o nome do pai, só depois o da mãe. A realidade histórica, da qual faz parte a vida humana, no seu começo, não é assim. Mas o Poder é assim. Rouba-nos tudo, até a Mãe. Até Deus Abba-Mãe. Em seu lugar, impinge-nos um Ídolo-Poder aque justifica e dá cobertura a todos os seus crimes. Somos humanos, porque somos filhos de mulher. Infinitamente mais do que simples animais racionais, macho e fêmea, filhos do Poder. Nuno Teotónio Pereira é filho de mulher. Não do Poder. As suas obras de ser humano e de arquitecto afectos e Causas é o que gritam aí para quem for capaz de ouvir e entender. Por mais que tentem silenciá-lo, reduzi-lo a coisa, memória, cadáver, jazigo, ícone.


Estive presente, ao modo de invisibilidade, que é também a máxima clandestinidade-fecundidade, na sua derradeira páscoa. Provavelmente, ninguém terá dado por mim. A não ser o seu filho Miguel. Porventura, também as filhas Luísa e Helena que, em momentos como este, demasiado teatralizados e manipulados para o meu gosto de presbítero-jornalista menino, sabem de mim invisível, clandestino. Estive, de resto, como o próprio Nuno também esteve, no funeral do cadáver que deixou como “restos mortais” (ou vitais?!) a serem semeados na Terra, ou lançados às águas de um rio, do mar, ou ao vento.


Conhecemo-nos desde os meus tempos de pároco de Macieira da Lixa, que eram também os tempos da Pide do regime de Salazar-Caetano e da igreja católica do Código de Direito Canónico e da Concordata. Que, para nossa vergonha, ainda hoje continua a ser. Apesar do Concílio Vaticano II. Apesar do 25 de Abril de 1974. Uma só Pide, dois Estados, o de Portugal e o do Vaticano. Que o Poder político, democrático que se diga, não sobrevive, muito menos, se desenvolve e fortalece sem polícia política e eclesiástica-religiosa. Sabe-se assassino do Humano Consciência e Liberdade e não se descuida um instante sequer. Conta com (quase) todos os melhores cérebros ao seu serviço, em cada um dos Estados. Podem mudar e mudam as formas históricas de assassinar o Humano Consciência e Liberdade, não muda o seu propósito de roubar, matar, destruir as populações, os povos e o planeta. Aliás, é o que o Poder nos três poderes em que historicamente subsiste, tem de mais específico, matar, roubar, destruir. Que para isso existem as elites privilegiadas. Todas, ou quase, ao seu serviço, umas mais do que outras. Com as mãos sujas de sangue humano, mesmo e sobretudo, quando são mãos de alguém que veste de branco e se faz aclamar por milhares, milhões de pés descalços, sem-terra, sem-casa, crucificados na cruz, o velho instrumento de tortura do império romano e do cristianismo, sua religião oficial e única. Naquele então, e ainda hoje, sempre, enquanto existir o cristianimo com suas múltiplas igrejas-empresas multinacionais religiosas e financeiras.


Um dia – já são muitos os anos, mas o momento dura para sempre – batem à porta da casa paroquial de Macieira da Lixa, já a Pide não se afastava da aldeia e o meu telefone estava sob permanente escuta. Encontrava-me em casa, como quem espera a chegada de alguém amigo e irmão anunciado pelo Vento que escuto, desde menino. Abro a porta e deparo com uma mulher e um homem, dois uma só carne, o mesmo Projecto de vida. A máxima discrição. Nunca nos havíamos visto presencialmente. Só no Vento, nos Afectos, nas grandes Causas da Humanidade, que não conhecem distâncias, nem fronteiras, nem línguas. Olhamo-nos nos olhos, ela e ele, um pouco mais velhos do que eu, ao mesmo tempo que ele me exibe junto aos olhos, como um beijo sororal, um simples Cartão de visita, onde pude ler, Nuno Teotónio Pereira, Arquitecto.
A porta da residência paroquial, construída para ser a casa-fonte de Opressão na aldeia, e comigo se tornou, enquanto nela residi, casa-fonte do Humano Consciência e Liberdade, franqueia-se, junto com os meus braços abertos, e vejo aquele Ser Humano, mulher e homem em indissolúvel unidade, entrar como em sua própria casa. 

Os três, clandestinamente sentados, reunidos no cartório, experimentamo-nos de imediato aqueles dois ou três de que fala Jesus, o do Evangelho de Mateus (18, 20) reunidos em seu Nome, com ele fecundamente actuante entre nós e connosco. Fico então a saber que o meu ser-viver presbiteral na trincheira e à intempérie é clandestinamente acompanhado e apoiado, na capital do país e noutros locais.


Percebo então que o Regime que, há anos me seguia-espiava-perseguia estava condenado a desaparecer, naquela sua atesanal forma corporativista do Ditador católico. Prosseguiria, contudo, anos depois, numa outra forma mais sofisticada, denominada democracia, onde as populações são cientificamente privadas de voz e de vez, ainda que tenham toda a liberdade para fazerem o barulho e as manifestações de rua que quiserem, contanto que sejam previamente requeridas ao Tirano de turno e aceitem ser devidamente enquadradas-”protegidas” pela Polícia, de choque, se necessário. Um regime – este nosso actual – onde as eleições livres são o cúmulo do obsceno político e o que há de mais maquiavélico, no que respeita a manipulação partidária, mediática, clerical-paroquial. E, sobretudo, financeira.


Vieram, não muito depois, as minhas já esperadas duas prisões políticas sem direito a caução (Julho 1970 e Março 1973) em Caxias e os respectivos julgamentos no Tribunal Plenário do Porto, mas o Nuno e a Natália nunca mais deixaram de integrar comigo aqueles dois ou três (re)unidos em nome de Jesus, o mesmo é dizer, em nome das vítimas dos poderes, os povos crucificados da Terra. Nunca mais esta nossa comunhão foi cortada, antes, aprofundada. E, agora, que ambos são já definitivamente viventes, por isso, definitivamente invisíveis aos olhos, a Natália, primeiro, o Nuno, por estes dias primeiros de Janeiro 2016, a comunhão entre nós é contínua e para sempre.


Quando, mais tarde, já eu presbítero-jornalista, acontece o Jornal Fraternizar, no qual, como profissional, tive de assumir a responsabilidade de Director, o Nuno faz-se assinante e sabemos um do outro na comunhão que o Vento ininterruptamente alimenta. Radicaliza-se progressivamente o meu caminho presbiteral, com muito de fecundamente insurreccional desarmado, mas nem isso, quebra a nossa comunhão. Muito pelo contrário. Quando venho depois a saber que o Nuno também radicaliza o seu ser-viver humano Consciência e Liberdade e arquitecto afectos e Causas, ao ponto de fazer retirar o h do seu nome original Theotónio, e de deixar de ser e de se dizer cristão, experimento-me ainda mais seu companheiro e irmão. Na convicção de que, para esse seu salto qualitativo em frente, de cristão a ser humano simplesmente, muito terá contribuído a sua atenta e crítica leitura do Jornal Fraternizar e de alguns dos meus Livros. Tudo nele é Humano Consciência e Liberdade, por isso, a negação do cristão que quiseram que ele fosse e que não pôde deixar de ser, neste país, então, tiranizado e infantilizado pela perversa dupla Cardeal Cerejeira-Oliveira Salazar, quando, até, já se nascia cristão.


Não entendo, por isso, porque ainda há quem, após a derradeira páscoa do Nuno, não abdique de presidir a missas de sétimo dia e outras coisas do género, como a querer dizer que o Nuno retrocedeu nas suas opções mais ontológicas. O que é manifestamente impossível. Porque, depois que provamos o Humano Consciência e Liberdade, nunca mais podemos regredir ao cristão, a total negação do Humano Consciência e Liberdade, filho de mulher e da Ruah, a de Jesus.


A concluir, quero sublinhar, uma vez mais, que com a sua derradeira páscoa, nem nós perdemos o Nuno, nem a Arquitectura perdeu o Arquitecto afectos e Causas que nunca antes o país e o mundo haviam conhecido. Porque o Sopro que suscitou os seus projectos e fez levantar as suas obras arquitectónicas traz a indelével marca do Vento, da Ruah, a mesma que está na génese de Jesus, o filho de Maria e que está também na do Nuno Teotónio Pereira, desde o primeiro instante da sua conceição. Rejubilemos, pois, com o ser-viver para sempre do Nuno, nosso companheiro e irmão universal. E comunguemo-lo a todo o momento no Vento que nos faz Humanos Consciência e Liberdade. Por agora, ainda nesta nossa limitada condição de visibilidade histórica, depois, na definitiva condição de invisibilidade. A mesma de Deus Abba-Mãe que nunca ninguém viu e nos habita, mais íntimo a nós do que nós próprias, nos próprios, total fusão, nenhuma confusão.


Mario de Oliveira

http://www.jornalfraternizar.pt/

31.01.16

Dez mil crianças refugiadas desapareceram numa semana


antonio garrochinho


Europol procura estas crianças que terão entrado na Europa e receia que muitas estejam nas mãos do crime organizado


Migrantes descansam num campo de refugiados, na vila Idomeni, norte da Grécia (EPA / Simela PANTZARTZI)
Mais de dez mil crianças migrantes não acompanhadas desapareceram na Europa entre 18 e 24 de dezembro passado, estima a Europol, agência de polícia europeia, que teme que muitas delas sejam exploradas, incluindo sexualmente, pelo crime organizado.

Os números, que foram divulgados na Internet pelo semanário britânico The Observer e confirmados à AFP pelo gabinete de imprensa da Europol.

De acordo com Brian Donald, diretor da Europol citado pelo The Observer, os números divulgados respeitam a crianças a quem se perdeu o rasto após o seu registo pelas autoridades europeias. Cerca de metade delas desapareceu em Itália.

“Não é exagerado dizer que estamos a procurar mais de 10.000 crianças", disse Brian Donald, segundo a AFP. No entanto, “não significa que todos estejam nas mãos de criminosos. Alguns podem ter sido entregues a familiares. Nós só não sabemos com quem estão nem onde estão”.


A Europol estima que 27% dos migrantes que entraram na Europa, em 2015, sejam crianças.  “Com ou sem papéis, estamos a falar de cerca de 270 mil crianças”. 

31.01.16

EUA : Flint, Michigan, o preço da austeridade


antonio garrochinho





EUA : Flint, Michigan, o preço da austeridade


por  António Santos
"Esta política teve um duplo efeito perverso: não só Flint se transformou numa das cidades mais pobres dos EUA, com 42 por cento da população abaixo no limiar da pobreza, como, por outro lado, o capital continuou o processo de desindustrialização, exigindo sempre pagar menos impostos para não destruir ainda mais empregos. Ao longo dos anos, o insaciável apetite dos capitalistas foi satisfeito sacrificando tudo o que é público, deixando sem manutenção pontes, estradas, escolas, a infra-estrutura eléctrica e a rede de água.
À semelhança de Detroit, também a cidade de Flint foi declarada falida e colocada sob o jugo de um «gestor de emergência», Ed Kurtz. Foi deste gestor não eleito mas com poderes irrestritos que partiu a decisão de poupar cinco milhões de dólares recorrendo ao ácido e poluído rio Flint. Foi quanto bastou para dissolver o revestimento que protege os velhos canos de chumbo e contaminar a água que milhares de famílias bebem." 
"crescem as suspeitas de que Flint é apenas a face visível de um crime de proporções nacionais e históricas. Segundo a insuspeita Fundação Ford, 132 milhões de estado-unidenses, quase metade da população dos EUA, estão expostos ao risco de intoxicação por chumbo e, de acordo com os dados do governo, há centenas de cidades como Flint no Luisiana, Maryland, Massachusetts, Alabama, Rhode Island e vários outros estados."
a cidade norte-americana de Flint, no Estado norte-americano do Michigan, a água que sai da torneira é veneno. Entre 2014 e a declaração do estado de emergência, no início deste mês, pelo menos 12 mil pessoas revelaram sintomas de envenenamento por chumbo e outras dez terão perdido a vida. As sequelas da ingestão de água contaminada com chumbo, a que as crianças são especialmente vulneráveis, incluem doenças mentais e reprodutivas irreversíveis.
A crise teve início com a decisão de deixar de comprar água à rede pública de Detroit e começar a abastecer a cidade directamente do rio Flint. Durante quase dois anos, contudo, o governador do Michigan, Rick Snyder, insistiu que as preocupações da população eram infundadas. Defendendo a poupança resultante do novo abastecimento local de água, o governador desdramatizava a cor alaranjada e o cheiro, remetendo garantias para os testes abonatórios conduzidos pela Agência de Protecção Ambiental (EPA, na sigla inglesa). A revelação de que a EPA adulterou esses testes, confirmada na semana passada pela demissão da directora da agência, Susan Helman, transformou Flint na sinistra alegoria da receita económica neoliberal que vinga nos EUA.
A história da contaminação da água de Flint começa muito a montante da decisão de abastecer a rede pública num rio poluído. Berço do principal sindicato da indústria automóvel dos EUA, Flint chegou a ser a morada de 80 000 operários da General Motors; hoje são menos de 5000. Nos anos oitenta, as grandes fábricas foram fazendo a trouxa para se mudaram para outros estados e outros países «mais competitivos». Os sucessivos governadores do Michigan, democratas e republicanos, procuraram seduzir o capital com benefícios fiscais para as grandes empresas e cortes na despesa pública. 
Um sistema venenoso 
Esta política teve um duplo efeito perverso: não só Flint se transformou numa das cidades mais pobres dos EUA, com 42 por cento da população abaixo no limiar da pobreza, como, por outro lado, o capital continuou o processo de desindustrialização, exigindo sempre pagar menos impostos para não destruir ainda mais empregos. Ao longo dos anos, o insaciável apetite dos capitalistas foi satisfeito sacrificando tudo o que é público, deixando sem manutenção pontes, estradas, escolas, a infra-estrutura eléctrica e a rede de água.
À semelhança de Detroit, também a cidade de Flint foi declarada falida e colocada sob o jugo de um «gestor de emergência», Ed Kurtz. Foi deste gestor não eleito mas com poderes irrestritos que partiu a decisão de poupar cinco milhões de dólares recorrendo ao ácido e poluído rio Flint. Foi quanto bastou para dissolver o revestimento que protege os velhos canos de chumbo e contaminar a água que milhares de famílias bebem.
Segundo documentos tornados públicos na semana passada, o governador do Michigan sabia que estava a envenenar a população. Entretanto, admitiu a culpa e ensaiou um estranho «pedido de desculpas» recusando-se, ainda assim, a apresentar a demissão. Nos emails filtrados pela imprensa, o governador refere-se à contaminação da água como uma «bola de futebol» com que «muitos estados jogam».
Com efeito, crescem as suspeitas de que Flint é apenas a face visível de um crime de proporções nacionais e históricas. Segundo a insuspeita Fundação Ford, 132 milhões de estado-unidenses, quase metade da população dos EUA, estão expostos ao risco de intoxicação por chumbo e, de acordo com os dados do governo, há centenas de cidades como Flint no Luisiana, Maryland, Massachusetts, Alabama, Rhode Island e vários outros estados.
 
 
Fonte: Avante
Mafarrico Vermelho

31.01.16

Narcoturismo’ ganha mercado do México à Argentina


antonio garrochinho



Na Argentina, como no México e Na Colômbia, o “narcoturismo” virou mania para promover atrações locais.

“Cayastá, un pueblo que te atrapa” ou, em português, “Cayastá, um povoado que lhe prende” é o novo lema turístico de uma cidade na província de Santa Fe, na Argentina. O aprazível lar de 4.500 habitantes às margens do Rio San Javier, ganhou fama mundial quando a polícia local prendeu os perigosos assassinos Víctor Schillaci e os irmãos Christian e Martín Lanatta, que fugiram duas semanas antes de uma prisão na província de Buenos Aires e eram procurados em todo o país.

Após a prisão, a secretaria de Turismo de Cayastá aproveitou para atrair visitantes. “A ideia saiu das redes sociais”, disse à Sputnik Viviana Agusto, secretária de Governo da região. “Houve uma votação por Twitter e esse lema ganhou. Logo criaram um circuito turístico pelo percurso dos fugitivos, mas isso não foi incentivado por nós porque Cayastá tem outros atrativos para promover”, completa.

Os fugitivos foram condenados em 2014 pelo crime de três empresários farmacêuticos que comercializavam efedrina e outras substâncias químicas com os cartéis mexicanos. Na fuga, percorreram mais de 500 quilômetros sem serem descobertos até que se perderam em Cayastá.

No México, onde Chapo Guzmán foi preso pela primeira vez, em 2014, foram organizados narcopasseios pelos lugares mais famosos. “Naquela época, os taxistas organizaram um passeio que incluía o Hotel Miramar, onde Chapo foi preso, e outros lugares conhecidos de sua vida”, conta à Sputnik Ami Guerrero, jornalista de “El Sol de Mazatlán”.

El Chapo esteve aqui

O passeio promovido pelos taxistas incluía também o Santuário de Jesús Malverde, o patrono dos narcotraficantes, a ponte onde penduravam os corpos dos inimigos de Guzmán, e o cemitério Jardines de Humaya, onde estão sepultados muitos narcotraficantes.

Os narcopasseios nasceram em Medellín, na Colômbia, onde várias agências realizam roteiros pelos lugares onde viveu Pablo Escobar, poderoso narcotraficante morto em 1993. A Fazenda Nápoles é parada obrigatória para os que viajam de carro de Bogotá até Medellín. “Quando chega à entrada da Fazenda Nápoles, que foi reconhecida como símbolo do sucesso do Cartel de Medellín e de Escobar, você se emociona. A fazenda foi convertida em um destino turístico muito empolgante, dando uma mudança radical a um lugar que no passado foi símbolo do narcotráfico e hoje é um lugar dedicado ao lazer. É muito bonito e recomendo visitar”, diz um viajante no site Tripadvisor.

A Despegar, uma das maiores agências de viagem da América Latina (que no Brasil tem o nome de Decolar), oferecia em 2015 um passeio de quatro horas por US$ 51 que incluía visitas à Fazenda Nápoles, ao Edifício Dallas e à tumba de Escobar com guias em inglês, espanhol e português. O site, contudo, tirou do ar a oferta após receber queixas por fazer propaganda negativa de Medellín.

Segundo o anúncio, o passeio terminava com toque familiar, já que terminava na casa de Roberto, irmão de Pablo Escobar, “que pessoalmente contará histórias sobre sua vida e abrirá a casa para que s=os turistas possam aprender a história da família”, dizia a descrição do passeio antes de este ser removido do site.


Sputniknews

www.marchaverde.com.br

31.01.16

NUDEZ: O OCIDENTE AJOELHA-SE PERANTE OS MUÇULMANOS


antonio garrochinho

A COLUNA DE OCTOPUS – NUDEZ: O OCIDENTE AJOELHA-SE PERANTE OS MUÇULMANOS

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Durante a visita do presidente iraniano Hassan Rohani ao museu do Capitólio, as estátuas milenárias desnudas foram encaixotadas porque iriam ferir a susceptibilidade deste representante muçulmano, o vinho também foi banido do protocolo.

Após ter sido recebido pelo Papa, Rohani teve o cuidado de referir que a liberdade de expressão não deveria permitir de insultar as pessoas de outras crenças. Verdade, nada menos verdade, cada país com a sua cultura não deveria ser sujeito a uma imposição de uma cultura diferente. Mas episódios destes revelam que o ocidente está disposto a sujeitar-se perante os dictames muçulmanos.

Um país tem direito à sua própria cultura e os visitantes têm de se adaptar ao país visitado. Quando uma ocidental visita um país muçulmano, se o quiser visitar, sabe que não pode usar uma mini-saia para não ofender os costumes locais. Na mesma ordem de ideias, um muçulmano que queira visitar um país ocidental sabe que existem mulheres de mini-sai, se não o suportam que não venham visita-lo.

A nudez e sua vergonha, quando muitos povos primitivos vivem nus, data do mito de que Adão e Eva viviam nus mas não tinham consciência da sua nudez. Foi apenas quando comeram o “fruto proibido” que tomaram consciência da sua nudez. A partir daí a nudez tornou-se vergonhosa.

O judaísmo, depois o cristianismo e finalmente o islamismo fizeram da nudez um crime. O vestuário levou a que servisse de diferenciação social. O “bom selvagem” nu era símbolo de inferioridade social.

Nos finais do século XX alguns movimentos naturistas, na Europa, e em particular na Alemanha e França, promoveram o nudismo como forma social de abolir diferenças e  uma aproximação à natureza.

A representação artística da nudez faz parte da cultura ocidental. Não é tolerável que uma religião recente venha impor padrão dos seus países quando visitam outros países.

Os bem-pensantes ocidentais não conseguem explicar por que, em nome da diversidade cultural ou religiosa, os país muçulmanos não aceitam a construção de uma igreja num país muçulmano enquanto nós aceitamos a construção de mesquitas nos nossos. Também não explicam por que é nós aceitamos mulheres de burca nos nossos países quando não aceitam mulheres de mini-saia nos deles.

Progressivamente os valores e a identidade europeia ocidental estão a desaparecer, ora possuídos pela febre consumista americana, ora por uma religião intolerável ortodoxa muçulmana.

 

 http://aviagemdosargonautas.net

31.01.16

31 de janeiro de 1891


antonio garrochinho


31 de janeiro de 1891
"O mais luminoso e viril movimento de emancipação que ainda sacudiu Portugal no último século" , assim definiu João Chagas o levantamento revolucionário de 31 de Janeiro de 1891, no Porto, a primeira grande tentativa republicana de derrube da monarquia.
As dezenas de soldados da cavalaria, infantaria, caçadores e guarda-fiscal da capital nortenha que, a partir das duas horas dessa madrugada de há 119 anos, e ao som de A Portuguesa avançaram para o centro da cidade, acompanhados por numerosos populares, viram frustados, no cimo da Rua de santo António, (dirigiam-se à Praça da Batalha, com o objectivo de tomar a estação de Correios e Telégrafos), o sonho da vitória. O tiroteio implacável da guarda municipal, instalada nas escadarias da igreja de Santo Ildefonso, travou a marcha revolucionária, causando 12 mortos e 40 feridos, entre civis e militares. 
 
Os revoltosos seriam rápida e friamente julgados e condenados a bordo de navios de guerra, ao largo de Leixões. Para além de civis, foram julgados 505 militares. Seriam condenados a penas entre 18 meses e 15 anos de prisão mais de duzentas pessoas. Em memória do levantamento, a rua onde tombaram os mártires seria rebaptizada, duas décadas depois, para Rua de 31 de Janeiro.
Horas antes do morticínio, Alves da Veiga, um dos líderes da revolta, tinha feito, da varanda da Câmara, a primeira e histórica proclamação da República.
O fracasso aconteceu porque - lembrou, quase um século depois, José Augusto Seabra - "apesar da coragem dos oficiais, dos sargentos e dos soldados, ladeados pelo povo anónimo e conduzidos por chefes como o alferes Malheiro, o capitão Leitão ou o tenente Coelho", os revoltosos em armas tinham a orientá-los dirigentes civis, activos e generosos, mas desconhecedores da boa estratégia militar.
Numa revolução gorada, encontra-se sempre um sem número de explicações para a derrota. E - como conta Gaspar Martins Pereira em Da Liga Patriótica do Norte ao 31 de Janeiro - os próprios mentores da revolução o reconheceram. Sampaio Bruno admitia, meses depois, no Manifesto dos Emigrados do 31 de Janeiro, a imprevisibilidade de aspectos fortuitos, de cobardias e de traições. Não se apontava, mas provavelmente pensava-se, na indiscrição e falta de tatcto político de Santos Cardoso, director do Jornal A Justiça Portuguesa, encarregado da ligação aos militares. Não se apontava, mas certamente pensava-se, nas posições do Directório Republicano e na falta de solidariedade activa da Maçonaria. Não se apontava, mas provavelmente reconhecia-se com amargura, os erros tácticos da operação militar.
A precipitação resultou essencialmente, como se apurou mais tarde, do anúncio das transferências de muitos dos militares implicados. Alves da Veiga e Basílio Teles eram, aliás, contrários à antecipação da revolta e tentaram, sem êxito, adiá-la. Mais determinados e impacientes, os sargentos tinham, no entanto, decidido avançar de imediato.
Por outro lado, as divergências no seio do Partido Republicano, aliadas a questões pessoais, como as existentes entre Homem Cristo e santos Cardoso, diminuíram a base de apoio e probabilidades de êxito do levantamento militar. E, todavia, muitas e prestigiadas figuras do movimento republicano de todo o país confiavam na vitória portuense.
Cerca de dois meses antes do 31 de Janeiro, Teófilo Braga escrevia a Santos Cardosos e, invocando a façanha dos dirigentes portuenses na Revolução Liberal de 1820, mostrava-se convicto de que a revolução iria triunfar no Porto. "Se estivermos à espera do levantamento de Lisboa - dizia o futuro primeiro chefe de um governo republicano - nunca ele virá, porque esta gente aqui é timorata e cheia de conveniências, tem medo da polícia, da guarda municipal (...) além disso, os dirigentes são elementos velhos que tudo empatam. A revolução do Porto é que pode acordar esta gente...".
Semente e batalha inicial de um longo combate até à vitória de Outubro de 1910, o movimento cívico e político nortenho, liderado por destacados republicanos como sampaio Bruno, Basílio Teles e João Chagas, cresceu rapidamente por força da grave crise económica e financeira e do profundo descontentamento popular perante as cedências do Governo e do Rei ao ultimato de 1890, que reclamava todo o território africano entre Angola e Moçambique.
O ambiente de exaltação revolucionária e patriótica no Porto foi exemplarmente traduzido pela Liga Patriótica do Norte, fundada a 26 de janeiro de 1890, logo a seguir ao ultimato. Presidida - a convite do monárquico Luís de Magalhães - pelo prestigiado poeta e socialista Antero de Quental, então radicado em Vila do Conde, a LPN reunia monárquicos e republicanos, irmanados no repúdio ao ultraje inglês e na ambição de recuperação de um país mergulhado em grave crise política, económica e social. 
Portugal - proclama Antero - expia com a amargura deste momento de humilhação e ansiedade de quarenta anos de egoísmo, de imprevidência e de relaxamento dos costumes políticos, quarenta anos de paz profunda que uma sorte raríssima nos concedeu e que só soubemos malbaratar na intriga, na vaidade, no gozo material, em vez de os aproveitar no trabalho, na reforma das instituições e no progresso das ideias".
Para o grande poeta - que após o fracasso do 31 de Janeiro regressa aos Açores, suicidando-se em Setembro de 1891 - o maior inimigo não era o inglês: " Somos nós mesmo, e só um falso patriotismo, falso e criminosamente vaidoso, pode afirmar o contrário. Declamar contra a Inglaterra é fácil: emendar os defeitos da nossa vida nacional será mais difícil (...) Portugal, ou se reformará, política, intelectual e moralmente, ou deixará de existir. Mas a reforma, para ser efectiva e fecunda, deve partir de dentro, do mais fundo do nosso ser colectivo: deve ser antes de tudo uma reforma dos sentimentos e dos costumes. enganam-se os que julgam garantir o futuro e assegurar a nacionalidade com meios exteriores e materiais, com armamentos e alarde de força militar ".
Mais directo, Guerra Junqueiro, outro grande poeta e militante da causa revolucionária, lança o desafio: "A revolução impõe-se. Hoje, quem diz pátria, diz república. Não uma república doutrinária, estupidamente jacobina, mas uma república larga, franca, nacional, onde caibam todos."
Dezanove anos depois, a república fez-se. Cem anos passaram. Será já uma República "larga", "franca" e de todos os portugueses?


Ler mais: http://republica-sba.webnode.com.pt/products/a31-de-janeiro-de-18911/

republica-sba.webnode.com.pt

31.01.16

BICHO CATÓLICO


antonio garrochinho

Foto de Guilherme Antunes.
Guilherme Antunes 
O bispo de Alcalá, monsenhor Juan Antonio Reig Pla afirmou que “as mulheres já pensam muito pela sua cabeça e, por isso, deve impedir-se-lhes de votar”.
Este espirro de punheta, que é um “general” da igreja católica, disse, ainda, que o feminismo “é um processo de desconstrução da pessoa”.
Militante da escuridão fascista, veio mais uma vez a público dar notícia do seu ódio ao mundo, desta vez como um campeão da misoginia.
Bem podem os cérebros do embuste vaticanista (a Cúria) prepararem novas estratégias de adormecimento dos fiéis, face ao assalto progressivo do capitalismo eleito, que acaba sempre por aparecer este tipo de monstros inquisitoriais ávidos do “sangue da manada”.

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