Depois de se impor nas eleições antecipadas do domingo e atingir uma maioria no parlamento do Japão, o premiê Shinzo Abe prepara-se para avançar em seu anseio de reformar a Constituição pacifista do país, uma das bases da democracia nipónica depois da Segunda Guerra. Os partidos políticos que favorecem a supressão do artigo 9, que declara ilegal a guerra como meio para resolver disputas internacionais, ficaram com quase 80% da bancada da câmara baixa.
Forças de Autodefesa do Japão. Via: AP
Desta maneira o opositor Partido Constitucional Democrático do Japão, que conseguiu apenas 54 dos 465 cadeiras em jogo, se transformou no principal defensor do pacifismo japonês e único obstáculo para os planos de reforma constitucional. Shinzo Abe disse que sua prioridade é buscar o consenso para a polémica e simbólica mudança na Constituição pacifista do Japão, que seus partidários veem como a base da democracia do pós-guerra enquanto os conservadores sentem uma imposição humilhante após a derrota do país em frente aos aliados na Segunda Guerra Mundial. Na prática o artigo 9 proíbe as operações ofensivas ou o uso no estrangeiro do exército, que no país recebe o nome de Forças de Autodefesa do Japão (FAJ). No meio das fortes tensões com o regime da Coreia do Norte a limitação militar auto-imposta faz com que Tóquio dependa de 50.000 tropas dos Estados Unidos assentadas no país para sua defesa. - "Primeiro, quero aprofundar o debate e conseguir que a maior quantidade de pessoas estejam de acordo com isto", disse o premiê a uma emissora local a última hora do domingo e depois de ficar sabendo dos resultados eleitorais. - "Deveríamos fazer disso uma prioridade", acrescentou o mandatário, quem pôs como meta conseguir a modificação em 2020.
Forças de Autodefesa do Japão. Via: AP
As emendas constitucionais no Japão requerem o apoio de uma maioria de dois terços de cada câmara do Parlamento e depois devem legitimadas por uma maioria em um referendo público, sem quórum mínimo. A anulação do artigo 9 é um velho anseio dos nacionalistas e seus alcances já tinham sido limitados em 2014, quando uma nova interpretação da Constituição, depois aprovada no Parlamento, permitiu às FAJ se mobilizarem para defender países aliados do Japão em caso de guerra. Em esse momento a decisão foi contestada por China e Coréia do Sul, países que sofreram nas mãos do militarismo japonês, mas Estados Unidos apoiou a medida para contar com Tóquio como aliado militar na região.
Shinzo Abe. Via: AP
A Constituição do Japão marcada pelo artigo 9 foi aprovada em 1947 e sob a supervisão das potências aliadas que ocuparam o país depois da vitória na Segunda Guerra Mundial. Além de estabelecer um sistema parlamentar e reduzir o papel do Imperador ao puramente cerimonial, tentou anular a possibilidade de um ressurgimento do militarismo na sociedade japonesa. Dois anos antes dos nazistas invadirem a Polônia e darem início à Segunda Guerra Mundial, o Império do Japão lançou um ataque sobre a República da China em 1937 e lançou uma brutal campanha de conquista no sudeste asiático que levou nos anos seguintes a tomar grande parte do gigante asiático, bem como também a Coréia, Vietnã, Myanmar, Malásia, Filipinas, Nova Guiné e um grande número de ilhas do Pacífico. A dura ocupação japonesa destas regiões provocou milhões de mortes e violações, e depois do colapso nipónico em 2 de setembro de 1945 ante os avanços dos Estados Unidos, do Commonwealth britânico e a União Soviética, e o bombardeio nuclear de Hiroshima e Nagasaki, as potências vencedoras e os países vizinhos que sofreram com a conquista buscaram evitar que a história se repetisse.
O escultor turco Selçuk Yılmaz é especialista em um tipo de escultura que causa dois impactos instantâneos: o fascínio por sua grandes esculturas e um certo desconforto com a matéria prima que ele usa. Ele utiliza as sobras de fios de aço martelado, em geral utilizados como alma de cabos elétricos de alta tensão. As esculturas são tão belas quanto cortantes, devido ao material, e trabalhar a forma que tomam suas obras finais deve ser uma tarefa ao mesmo tempo titânica e perigosa.
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O caso é que este dicotomia se funde para dar um terceiro significado a sua obra: a do animal selvagem musculado que ele consegue esculpir. Para fazer estas esculturas, Selçuk precisa de quase um ano de trabalho para cortar, martelar e soldar cada peça de metal individualmente. Evidentemente que tal tarefa não está livre de risco e o escultor turco diz que acaba levando em sua pele a lembrança de cada uma de suas esculturas.
Suas obras geralmente retratam animais em máscaras de cabeças de bichos selvagens, como um lince, tigre e raposa. Mas sua assinatura é mesmo os leões de corpo inteiro. O artista turco, de alguma forma, consegue imprimir toda a fluidez, as características faciais e a estrutura muscular usando os fragmentos de fios de aço.
Vale a pena notar quão bem o metal acaba se prestando à forma final desse gato impressionante da sua última obra, o leão Kali, que pesa aproximadamente 300 kg (primeiras 4 fotos).
Não sou fruto das circunstâncias. Também não nasci assim. Estou cada vez menos fatalista. À medida que o tempo vai passando, quanto mais tempo vivo, mais aberrante e despropositada me parece a resignação. Não conheço o meu destino, mas conheço o meu desejo. Não acredito no determinismo, no fatalismo e nem em quem põe as cartas! Acredito em mim, apesar de saber que todos somos seres condicionados, sei que muito do que farei e serei depende de mim. Resta-me fazer o que sempre fiz: continuar a percorrer o meu caminho com a determinação possível.
Homem de letras português, um dos vultos mais destacados da Geração de 70, José Duarte Ramalho Ortigão nasceu a 24 de Outubro de 1836, no Porto , e morreu a 27 de Setembro de 1915, em Lisboa . Oriundo de uma família abastada da burguesia portuense e filho de um combatente pela causa liberal, Ramalho conviveu durante a infância com o ambiente rural da casa da avó materna, tendo sido criado, como confessa, "como um pequeno saloio". Na adolescência, enquanto convalescia de uma febre, tomou contacto com as Viagens na minha Terra , obra que o impressionou tanto que foi a partir da sua leitura que compreendeu que "tinha de ser fatalmente um escritor". Frequentou o curso de Direito na Universidade de Coimbra e, aos dezanove anos, começou a leccionar francês no Colégio da Lapa, dirigido pelo seu pai, onde teve como aluno Eça de Queirós, futuro amigo e companheiro de lides literárias. Durante a década de 60, colaborou em vários periódicos, como a Gazeta Literária do Porto , a Revista Contemporânea e o Jornal do Porto , de que foi redactor. Foi precisamente neste último que, em 1866, publicou o folheto Literatura de Hoje , com que intervém na Questão Coimbrã . Ramalho, que, quatro anos antes, a propósito da polémica suscitada pela Conversação Preambular de Castilho inserta no poema D. Jaime , de Tomás Ribeiro, se manifestara contra o chamado "Grupo do Elogio Mútuo", não deixa aqui de ser crítico para com o autor das Cartas de Eco a Narciso , mas acusa Antero e Teófilo de desrespeitarem o velho escritor. Como consequência, Antero desafiou e venceu Ramalho em duelo, datando curiosamente desse episódio o início da amizade entre os dois escritores e a aproximação gradual de Ramalho a esse grupo de novos intelectuais, que se traduziria na frequência do Cenáculo e na adesão às correntes ideológicas que marcaram essa geração, como o positivismo de Comte e o socialismo utópico de Proudhon. Depois de uma viagem a Paris, por ocasião da Exposição Universal de 1867, Ramalho publicou, no ano seguinte, as suas primeiras notas de viagem, Em Paris . Ainda no mesmo ano, mudou-se para Lisboa, onde assumiu o lugar de oficial de secretaria da Academia das Ciências e reencontrou o seu amigo Eça, já formado em Direito pela Universidade de Coimbra. Em 1870, publicaram ambos O Mistério da Estrada de Sintra . Em 1871, não participando directamente nas Conferências do Casino Lisbonense , iniciou com Eça um novo projecto, que pretendia retomar a intenção crítica e de reforma social que norteou as Conferências: As Farpas. O início da redacção de As Farpas é, aliás, tido pelos críticos (entre os quais o próprio Eça, numa carta publicada na revista portuense A Renascença ) como um marco de transição na escrita de Ramalho, que teria passado de "folhetinista diletante" a "panfletário ilustre". Após a partida de Eça para Cuba, como cônsul, em 1872, Ramalho tomou nas mãos a redacção desses folhetins satíricos, cuja publicação até 1888 entremeou com a edição de livros de viagens: Pela Terra Alheia (1878-1880), A Holanda (1883), John Bull (1887) e, inspirados pelas viagens em Portugal, Banhos de Caldas e Águas Minerais (1875) e As Praias de Portugal (1876). Em todas estas obras, embora as imagens da França e da Inglaterra e os progressos das suas civilizações sejam contrapostos à decadência portuguesa, manifesta-se um apego à tradição nacional e a crença na possibilidade de regeneração. A partir de 1888, Ramalho começou a fazer parte das reuniões do grupo dos Vencidos da Vida. Em 1895, tornou-se bibliotecário do Palácio da Ajuda. Nos textos escritos perto do fim da vida e já depois de instaurada a República, que serão postumamente reunidos no volume Últimas Farpas , Ramalho manifestou a sua descrença no novo regime político.
Dotado de um espírito cosmopolita, dândi, mundano, e simultaneamente, arreigado às tradições nacionais, Ramalho procurou sinceramente educar e civilizar a sociedade do seu tempo. A variedade dos seus escritos, o diletantismo do seu discurso, a leveza e propriedade do seu estilo, oscilando entre as notações estéticas, as digressões líricas, os apontamentos humorísticos espelham a fidelidade ao preceito de escrita e de vida enunciado na sua "Autobiografia" (in Costumes e Perfis ): "Maçar o menos possível que seja o meu semelhante, procurando tornar para os que me cercam a existência mais doce, o mundo mais alegre, a sociedade mais justa, tem sido a regra de toda a minha vida particular. O acaso fez de mim um crítico. Foi um desvio de inclinação a que me conservei fiel. O meu fundo é de poeta lírico."
Fontes: Ramalho Ortigão . In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013.
wikipedia (Imagens)
Ramalho Ortigão
Excerto de "As Farpas"
"Aproxima-te um pouco de nós, e vê. O país perdeu a inteligência e a consciência moral. Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada, os carácteres corrompidos. A prática da vida tem por única direcção a conveniência. Não há principio que não seja desmentido. Não há instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita. Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos. Ninguém crê na honestidade dos homens públicos. Alguns agiotas felizes exploram. A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia. O povo está na miséria. Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente. O desprezo pelas ideias em cada dia. Vivemos todos ao acaso. Perfeita, absoluta indiferença de cima abaixo! Toda a vida espiritual, intelectual, parada. O tédio invadiu todas as almas. A mocidade arrasta-se envelhecida das mesas das secretárias para as mesas dos cafés. A ruína económica cresce, cresce, cresce. As quebras sucedem-se. O pequeno comércio definha. A indústria enfraquece. A sorte dos operários é lamentável. O salário diminui. A renda também diminui. O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo. Neste salve-se quem puder a burguesia proprietária de casas explora o aluguer. A agiotagem explora o lucro. A ignorância pesa sobre o povo como uma fatalidade. O número das escolas só por si é dramático. O professor é um empregado de eleições. A população dos campos, vivendo em casebres ignóbeis, sustentando-se de sardinhas e de vinho, trabalhando para o imposto por meio de uma agricultura decadente, puxa uma vida miserável, sacudida pela penhora; a população ignorante, entorpecida, de toda a vitalidade humana conserva unicamente um egoísmo feroz e uma devoção automática. No entanto a intriga política alastra-se. O país vive numa sonolência enfastiada. Apenas a devoção insciente perturba o silêncio da opinião com padre-nossos maquinais. Não é uma existência, é uma expiação. A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências. Diz-se por toda a parte: o país está perdido! Ninguém se ilude. Diz-se nos conselhos de ministros e nas estalagens. E que se faz? Atesta-se, conversando e jogando o voltarete que de norte a sul, no Estado, na economia, no moral, o país está desorganizado-e pede-se conhaque!"
in Farpas, por Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão, com publicação em Junho de 1871.
Nemo, o cão presidencial francês, começa a ser uma estrela nas redes sociais. Conhecido por “fazer das suas”, deu que falar, nos últimos dias, ao decidir aliviar-se em pleno Palácio do Eliseu, pouco impressionado pelo facto de que o presidente Emmanuel Macron se encontrava numa reunião com três membros do seu Governo.
O momento foi captado pelas câmaras do canal de informação francês LCI. O video tem sido um sucesso nas redes. Houve mesmo quem perguntasse se Nemo tinha a intenção de processar quem o filmou, porque “violavam o seu direito à privacidade”, numa alusão à nem sempre calorosa relação entre o presidente Emmanuel Macron e a imprensa.
Foi numa lareira da sala onde o presidente se encontrava em reunião que tudo aconteceu. Durante a troca de palavras, captada pela LCI, foi possível ouvir um leve ruido, tradicionalmente associado à urina, que depressa deixou desconcertados os intervenientes na reunião.
Um dos membros do Governo acaba por perguntar a Macron se Nemo adotava este tipo de comportamentos de forma habitual, entre risos, ao que o presidente francês respondeu que eram as três pessoas, que se encontravam na reunião, que “despertavam no cãozinho um comportamento totalmente inabitual”.
Casa deixa de contar para o IRS quando se muda o crédito de banco
A transferência do crédito para outra entidade bancária "corresponde à celebração de novo contrato"
As famílias que contraíram empréstimo para comprar casa e o fizeram até ao final de 2011 ainda podem abater uma parcela dos juros ao IRS. Mas se mudarem o crédito para outro banco à procura de melhores condições perdem o direito a esta dedução fiscal. Este é o entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira, que, em resposta a um um pedido de informação vinculativa de um contribuinte, conclui que a transferência do crédito para outra entidade bancária "corresponde à celebração de novo contrato".
"A verificar-se, à data [presente], uma transferência do crédito à habitação para uma outra entidade bancária, o que mais não corresponde que à celebração de um novo contrato de crédito, não poderá o sujeito passivo beneficiar do disposto no artigo 78.º E [dedução de encargos com imóveis] do Código do IRS, uma vez que o mesmo ocorrerá em data posterior ao legalmente estabelecido para o efeito", considera a AT.
Este entendimento ajuda também a perceber por que motivo 2015 foi o ano em que o número de famílias que indicaram ter despesas com a compra de casa na sua declaração do IRS foi mais baixo. Em 2008 foram 1,1 milhões e em 2015 baixou para 1,07 milhões de agregados.
A mudança do crédito de um banco para outro ganhou relevância nestes últimos anos, refletindo a dinâmica do mercado imobiliário. Depois de vários anos com a torneira do crédito muito apertada, os bancos voltaram a estar mais disponíveis para emprestar dinheiro e regressaram as campanhas que acentuam as vantagens de cada oferta - nos spreads e nos custos associados aos empréstimos.
A importância dos encargos com o empréstimo da casa em matéria de deduções à coleta do IRS sofreu um corte significativo de 2012 em diante. Até aí, era possível abater 30% dos encargos com o crédito para compra de habitação própria e permanente até ao limite de 591 euros. Este valor era majorado em 10% em imóveis com uma classificação energética das classes A e A+.
O cerco a esta dedução foi uma das medidas delineadas no âmbito do programa de ajustamento financeiro a que Portugal teve de se submeter depois de pedir ajuda externa ao FMI, BCE e Comissão Europeia (a troika). O limite dedutível não só foi fortemente reduzido como passou apenas a ser possível abater uma parte dos juros (a amortização ficou fora da equação). Além disso, só os empréstimos contratados até ao final de 2011 podem ainda ser usados para reduzir o imposto.
Atualmente é possível abater ao IRS 15% do montante gasto em juros com empréstimos para compra, construção ou beneficiação de imóveis até ao limite de 296 euros. Em contrapartida, as rendas mantiveram um regime mais generoso, atualmente balizado nos 502 euros por agregado. Esta solução deu resposta a duas das linhas de ação defendidas pela troika: reduzir a fatia da despesa fiscal do Estado e desincentivar a compra de casa própria numa altura em que o nível de endividamento das famílias estava em valores máximos.
Deduções em queda
Os dados estatísticos disponíveis dão conta do efeito desta mudança. Em 2008, quando as Euribor (indexante usado para a generalidade dos créditos hipotecários em Portugal) tocava máximos historicamente altos, cerca de 1,1 milhões de agregados familiares reportaram encargos com imóveis no seu IRS tendo conseguido abater 580 milhões de euros (ver gráfico).
Um ano depois, o valor das deduções com imóveis foi de 562 milhões de euros, tendo-se sempre mantido em valores acima dos 500 milhões até 2011.
Daí em diante, a despesa fiscal (ou seja, aquilo que o Estado prescinde de receber) associada aos encargos com imóveis por parte das famílias sofreu uma forte redução, tendo caído para os 230 milhões de euros e, em 2013 , deu novo trambolhão, desta feita para os 182 milhões de euros.
Em 2015 (último ano para o qual há dados publicados pela AT) reduziu-se ainda mais, para os 169 milhões de euros. Para esta quebra concorrem dois fatores: a perda desta isenção por parte de quem vai mudando de banco ou vendendo a casa para comprar outra e o recuo dos juros na parcela da mensalidade, por causa de as taxas estarem em mínimos históricos.
«O grande auditório do Núcleo Central do Taguspark, em Porto Salvo, foi pequeno para as centenas de pessoas que quiseram assistir à tomada de posse do novo presidente da Câmara de Oeiras, tendo sido colocado um ecrã gigante no exterior para os que não tiveram lugar puderem acompanhar a cerimónia. Trinta minutos depois da hora marcada, às 18:30, Isaltino Morais entrou na sala, merecendo um longo aplauso de pé de todo o auditório»
Este texto, tão curto, contém uma inverdade e um exagero. A inverdade é que eu não fui lá para ver a tomada de posse do novo presidente da Câmara. O exagero é que nem todo o auditório o aplaudiu. Entre muitos que não aplaudiram, um deles fui eu. E quanto ao estar de pé, já estava. É que para recolher a imagem para a produção do vídeo que se segue, sentando, ninguém consegue...
Em 1989 houve uma guerra no vale do Lila, em Valpaços. Centenas de pessoas juntaram-se para destruir 200 hectares de eucaliptal, com medo que as árvores lhes roubassem a água e trouxessem o fogo. A polícia carregou sobre a população, mas o povo não se demoveu.
22/10/2017
Em quase três décadas o Lila escapou ileso aos incêndios. Hoje, todos dizem que é por se terem livrado dos eucaliptos. E lamentam que o resto do país não lhes tenha resistido.
A 31 de março de 1989 o povo de Valpaços invadiu uma quinta no vale do Lila para arrancar os 200 hectares de eucalipto que a Soporcel tinha plantado na região. [Arquivo JN]
A polícia respondeu com uma carga à população, mas revelou-se incapaz de travar os avanços de 800 populares sobre a propriedade. [Arquivo JN]
Quando a cavalaria da GNR se viu cercada, entrou em campo o corpo de intervenção. Só aí os ânimos acalmaram. [Arquivo JN]
No vale do Lila não há mais de sete ou oito aldeias e todas vivem do olival. Os eucaliptos secar-lhes-iam os terrenos e trar-lhes-iam incêndios.
António Morais foi o cabecilha dos protestos. Percorrendo as aldeias depois da missa foi convencendo o povo que o lucro fácil traria prejuízos a médio prazo.
Hoje, o povo sente que a destruição dos eucaliptos foi a sua salvação. E dizem que, se tivessem deixado aquela floresta avançar, não teriam escapado aos incêndios de 2017.
Hoje os terrenos da quinta do Ermeiro são diversos. Há oliveiras e nogueiras, amêndoa e pinho. Em três décadas, nenhum incêndio.
João Sousa esteve na organização dos protestos à socapa, era presidente da freguesia da Veiga do Lila. «Dizem que somos um povo sem educação mas afinal nós é que estávamos certos.»
Os eucaliptos tinham sido plantados há pouco tempo, não foi preciso usar sacholas nem enchadas. Foram arrancados pelas mãos de homens e mulheres, canalha e velharia.
A oliveira e o azeite sempre foram a riqueza da região. É sobretudo disso que ainda vivem hoje as populações de Valpaços.
Ester Oliveira viu o marido ser detido durante os confrontos por posse de arma ilegal. «Foi o povo que o salvou por dizer que ele não arredava pé enquanto ele não fosse libertado.»
A população tinha recuado depois da chegada do corpo de intervenção, mas voltara à carga para defender José Oliveira. A guerra terminou com a sua libertação.
Alguns dos organizadores foram levados a tribunal por invasão de propriedade privada e condenados a pena suspensa. E todos dizem que voltariam a repetir o crime.
Natália Esteves organizou assembleias, bateu à porta dos vizinhos, conseguiu convencer dezenas de agricultores que o eucalipto traria seca e fogo.
Dos 200 hectares de eucalipto não sobram hoje mais do que uma dúzia de árvores junto ao casario do Ermeiro. Se alguém os quiser plantar, o povo arranca-os.
Maria João Sousa tinha 15 anos quando viu a revolução chegar à sua aldeia. Diz que foi o 25 de Abril da sua gente.
Em quase três décadas o Lila escapou ileso aos incêndios. Hoje, todos dizem que é por se terem livrado dos eucaliptos. E lamentam que o resto do país não lhes tenha resistido.
A 31 de março de 1989 o povo de Valpaços invadiu uma quinta no vale do Lila para arrancar os 200 hectares de eucalipto que a Soporcel tinha plantado na região. [Arquivo JN]
Texto de Ricardo J. Rodrigues | Fotografia de Rui Oliveira / Global Imagens
«Foi o nosso 25 de Abril», diz Maria João Sousa, que tinha 15 anos quando a revolução chegou à sua terra. No dia 31 de março de 1989, a rebate do sino, 800 pessoas juntaram-se na Veiga do Lila, uma pequena aldeia de Valpaços, e protagonizaram um dos maiores protestos ambientais que alguma vez aconteceram em Portugal.
A ação fora concertada entre sete ou oito povoações de um escondidíssimo vale transmontano, e depois juntaram-se ecologistas do Porto e de Bragança à causa. Numa tarde de domingo, largaram todos para destruir os 200 hectares de eucalipto que uma empresa de celulose andava a plantar na quinta do Ermeiro, a maior propiedade agrícola da região.
À sua espera tinham a GNR, duas centenas de agentes. Formavam uma primeira barreira com o objetivo de impedir o povo de arrancar os pés das árvores, mas eram poucos para uma revolta tão grande.
«Naquele dia ninguém sentia medo. Eles atiravam tiros para o ar e parecia que tínhamos uma força qualquer a fazer-nos avançar», lembra Maria João Sousa.
Maria João, que nesse dia usava uma camisola vermelha impressa com a figura do Rato Mickey, nem deu pelo polícia que lhe agarrou no braço. «Ide para casa ver os desenhos animados», atirou-lhe, mas a rapariga restaurou a liberdade de movimentos com um safanão: «Estava tão convicta que não sentia medo nenhum. Naquele dia ninguém sentia medo nenhum. Eles atiravam tiros para o ar e parecia que tínhamos uma força qualquer a fazer-nos avançar.»
A tensão subiria de tom ao longo da tarde. «Houve ali uma altura em que pensei que as coisas podiam correr para o torto», diz agora António Morais, o cabecilha dos protestos. Havia agentes de Trás os Montes inteiros, da Régua e de Chaves, de Vila Real e Mirandela.
Mas também lá estava a imprensa, e ainda hoje o homem acredita que foi por isso que a violência não escalou mais. Algumas cargas, pedrada de um lado, cacetadas do outro, mas nada que conseguisse calar um coro de homens e mulheres, canalha e velharia: «Oliveiras sim, eucaliptos não».
«Não queríamos arder aqui todos»
A guerra tinha começado a ser preparada um par de meses antes, quando António Morais, proprietário de vários hectares de olival no Lila, percebeu que uma empresa subsidiária da Soporcel se preparava para substituir 200 hectares de oliveiras por eucaliptal para a indústria do papel. «Tinham recebido fundos perdidos do Estado para reflorestar o vale sem sequer consultarem a população», revolta-se ainda, 28 anos depois.
«Nessa altura o ministério da agricultura defendia com unhas e dentes a plantação de eucalipto.» Álvaro Barreto, titular da pasta, fora anos antes presidente do conselho de administração da Soporcel e tornaria ao cargo em 1990, pouco depois das gentes de Valpaços lhe fazerem frente.
«A tese dominante dos governos de Cavaco Silva era que urgia substituir o minifúndio e a agricultura de subsistência por monoculturas mais rentáveis, era preciso rentabilizar a floresta em grande escala», diz António Morais. O eucalipto adivinhava-se uma solução fácil.
Crescia rápido e tinha boas margens de lucro. Portugal, aliás, ganharia em poucos anos um papel de destaque na indústria de celulose e os pequenos proprietários poderiam resolver muitos problemas de insolvência abastecendo as grandes empresas com uma floresta renovada. A teoria acabaria por vingar em todo o país, sobretudo no interior centro e norte. Mas não em Valpaços.
«Numa região onde a água é tudo menos abundante, teríamos [por causa do eucalipto] problemas de viabilidade das outras culturas», diz António Morais.
«Comecei a ler coisas e percebi que o eucalipto nos traria grandes problemas», continua António Morais. «Por um lado, numa região onde a água é tudo menos abundante, teríamos grandes problemas de viabilidade das outras culturas. Nomeadamente o olival, que sempre foi a riqueza deste povo. E depois havia os incêndios, que eram o diabo. São árvores altamente combustíveis e que atingem uma altura muito grande.»
Na terra quente transmontana o ano são oito meses de inverno e quatro de inferno. O fogo, tinha ele a certeza, chegaria com aquele arvoredo.
Uns meses antes da guerra, começou a conversar sobre o seu medo com algumas das mais relevantes personalidades do vale. Grandes proprietários, políticos da terra, as famílias mais reconhecidas. «Lentamente começou a formar-se um consenso de que o lucro fácil do eucalipto seria a médio prazo a nossa desgraça. Não queríamos deixar secar a nossa terra. E não queríamos arder aqui todos. Tínhamos de destruir aquele eucaliptal, custasse o que custasse.»
Anatomia da conspiração
O núcleo duro estava formado, era constituído por dezena e meia de agricultores capazes de mobilizar o resto do povo. «Aos domingos, íamos às aldeias e no fim da missa explicávamos às pessoas o que podia acontecer à nossa terra», lembra Natália Esteves, descendente de uma família de grandes produtores de azeite feita de repente líder de protesto ecológico. «E também íamos de casa em casa, esclarecer quem não tinha estado nas assembleias.»
Ao início houve renitência, a madeira valeria sempre mais do que a azeitona, e a castanha ainda não rendia o que rende hoje. «Mas tentámos sempre centrar a conversa no que aconteceria daí a uns anos, dizer que os eucaliptos secariam os solos e o povo ficaria refém de uma única cultura, que se alguma coisa corresse mal não teriam mais nada.»
O que mais assustava aquela gente, no entanto, era o fogo. «Onde há eucalipto, tudo arde. E então o povo já não chamava a árvore pelo nome, mas por fósforos.» A primeira batalha estava ganha: tinham o apoio da população.
João Sousa era nessa altura presidente da junta da Veiga do Lila. «Oficialmente não podia dizer que era contra os eucaliptos, nem ir contra a polícia. Mas, quando falava com as pessoas, dizia-lhes o que haviam de fazer», conta agora com uma gargalhada e sem ponta de medo.
«Vê, nem um eucalipto plantado. E o nosso vale há mais de 30 anos que não arde», diz João de Sousa.
«Então se tínhamos o melhor azeite do país íamos dar cabo dele para enriquecer uns ricalhaços de fora?» Tem 86 anos e uma destreza de 30, hoje estuga o passo para mostrar a zona que podia ter sido caixa de fósforos. «Vê, nem um eucalipto plantado. E o nosso vale há mais de 30 anos que não arde. Se o povo não se tem unido hoje estávamos a viver a mesma desgraça que vimos por esse país fora.»
Essa é aliás a conversa mais recorrente por estes dias no vale do Lila. A tragédia florestal portuguesa dá a este povo a impressão que eles sim, tinham razão há muitos anos, quando o governo e as autoridades lhes diziam o contrário.
«Podem achar que somos gente do campo, sem educação nem conhecimento, mas nós cá soubemos defender a nossa terra», diz o velhote. «Temos chorado muito por esta gente que perdeu vidas e animais e casas. E há uma coisa que o meu povo sabe: se temos deixado ficar os eucaliptos, também hoje choraríamos pelos nossos.»
A guerra
Há uns dias que os combates tinham começado. Ataques furtivos do povo, desorganizadamente, para arrancar pés de eucalipto nos limites do Ermeiro. Duas semanas antes da guerra, no Domingo de Ramos, as coisas aqueceram.
«Juntámos duas centenas de pessoas aqui destas aldeias e os donos da empresa chamaram a GNR», lembra António Morais. «Quando eles chegaram já tínhamos dado cabo de uns bons 50 hectares de eucaliptal.» Nesse dia não houve confrontos, porque o povo fugiu. Mas anunciaram a alto e bom som que voltariam depois da Páscoa.
Esse ataque tinha feito notícia no Jornal de Notícias e trazido uma mão-cheia de jornalistas à terra, nomeadamente Miguel Sousa Tavares, da RTP. «Percebi que as coisas estavam a tornar-se muito grandes e foi então que contactei a Quercus. Precisávamos de ajuda.»
Do outro lado da linha atendeu Serafim Riem, que dirigia o núcleo do Porto da organização ambientalista. O ecologista partiu imediatamente para o terreno. Nesses dias ouviriam do parlamento em Lisboa várias palavras de solidariedade. Sobretudo do PCP, d’Os Verdes e de um jovem deputado socialista chamado José Sócrates.
Agora não valia a pena esconder mais nada. A 31 de março de 1989, domingo depois da Páscoa, o povo juntar-se-ia todo na Veiga do Lila para dar cabo do eucaliptal que restasse. A aldeia enchera-se de jornalistas, havia até um helicóptero a cobrir os acontecimentos do ar.
A direção nacional da Quercus demarcar-se-ia da organização dos protestos através de um comunicado, mas os núcleos do Porto e Bragança encheriam cada um o seu autocarro de ambientalistas carregados de cartazes. Às duas da tarde o sino começou a tocar a rebate. Oito centenas de vozes entoavam «oliveiras sim, eucaliptos não» e largaram por um caminho de terra batida para a quinta do Ermeiro.
Numa hora, foram arrancados 180 hectares de pequenas árvores. «Alguns gozavam com os agentes na cara e levaram umas bastonadas», recorda Natália Esteves.
Não era preciso usar enchadas nem sacholas, os eucaliptos tinham sido plantados há pouco tempo e arrancavam-se com as mãos. A polícia tentava fazer uma linha de defesa, mas duas centenas de agentes não chegavam para aquela gente toda.
Numa hora, foram arrancados 180 hectares de pequenas árvores. «Alguns gozavam com os agentes na cara e levaram umas bastonadas das boas», recorda Natália Esteves. Os que eram de perto diziam-lhes assim: «Tendes razão, por isso vamos fingir que não vemos.» Viravam as costas e o povo ia subindo o terreno.
Num instante, o casario da quinta tornava-se no último reduto da investida. Uma dezena de guardas saíram a cavalo, era demonstração de força mas não surtiu resultado. A Soporcel tinha construído socalcos para plantar os eucaliptos e, agora, os animais não conseguiam descê-los.
«O povo ia atirando pedras aos guardas, houve um que acertou no cavalo e mandou-o abaixo», diz João Morais. Foi nesse momento que entrou em campo o corpo de intervenção, disposto a levar toda a gente pela frente. «Aí as coisas podiam ter descambado definitivamente.»
Todos por um
A guarda especializada avançava agora colina abaixo com escudos e capacetes. José Oliveira, um agricultor da pequena aldeia de Émeres, tentou escapar pela lateral, mas foi logo caçado pela guarda. No bolso trazia um revólver e foi isso que o tramou. «Levaram-no logo detido para dentro do jipe por posse de arma ilegal», conta agora a sua viúva, Ester.
Aquela detenção marcaria o início do fim da guerra. «As pessoas tinham recuado por causa do corpo de intervenção, mas quando se aperceberam que um dos nossos estava preso começaram a gritar que não arredariam pé enquanto ele não fosse solto», diz João Morais. Ester anui, «foi o vale inteiro que salvou o meu homem.» Agora já não havia pedras, havia gritos. Que libertassem o tio Zé e rápido.
Serafim Reim, o homem da Quercus, é que foi lá negociar a libertação com os guardas. Sobravam menos de 20 hectares de eucalipto, o povo deixá-los-ia em paz se soltassem o velhote. Uma hora depois, houve consenso. Identificaram José Oliveira, caçaram-lhe a arma e mais tarde levaram-no a tribunal, mas naquele dia saiu pelo seu pé para os braços da mulher, e daí para casa.
António Morais, Natália Esteves, João Sousa e mais uma dezena de organizadores do protesto também seriam chamados à barra da justiça, um ano depois enfrentaram acusação de invasão de propriedade privada e foram condenados com pena suspensa.
«Ainda vieram uns engenheiros da Soporcel dizer que retirariam a queixa se nos comprometêssemos a não destruir uma nova plantação de eucalipto. Disse-lhes que nem pensar, aqui nunca teríamos árvores dessas no nosso vale.»
Nas noites seguintes arrancou-se à socapa quase tudo o que faltava, ficaram apenas meia dúzia de hectares a rodear o casario da quinta, mais passível de vigia. A Soporcel acabaria por desistir e vender a propriedade e a família que a comprou, quando ousou confessar a Natália Esteves que pensavam plantar eucaliptos, foram logo avisados: «Se os botais nós os arrancamos.»
«A única maneira de travar os incêndios em Portugal é reduzir o eucaliptal e substituí-lo pela floresta autóctone», diz o ambientalista Serafim Riem.
Hoje, o Ermeiro é terra de nogueiras e amendoeiras, oliveiras e pinho. Nunca ardeu. Serafim Riem, o ambientalista da Quercus, diz que até hoje a guerra do povo de Valpaços é um marco, a maior ligação jamais vista no país entre o mundo rural e o ativismo ecológico.
«A única maneira de travar os incêndios em Portugal é reduzir drasticamente o eucaliptal e substituí-lo pela floresta autóctone, que não só tem melhor imunidade ao fogo como gera uma riqueza mais diversificada para as populações.»
Naquele 31 de março de 1989, o povo uniu-se e, diz agora, salvou-se. «Nós é que tínhamos razão», repetem uma e outra vez, repetem todos. Às seis da tarde, depois de José Oliveira ser libertado, um vale inteiro voltou pelo mesmo caminho e juntou-se no principal largo de Veiga do Lila. Mataram-se dois borregos e um leitão, abriram-se presuntos e deitaram-se alheiras à brasa, houve até quem trouxesse uma pipa de vinho. A festa durou noite dentro e foi maior do que qualquer romaria de Santa Bárbara.
À volta da fogueira acabariam por juntar-se também os guardas que horas antes defendiam o Ermeiro. E ali ficaram a comer e beber, vencedores e vencidos, que em Trás-os-Montes nunca se nega hospitalidade. Maria João Sousa nunca tinha visto uma coisa daquelas, nem nunca voltaria a vê-la na sua terra. Foi o 25 de Abril da sua gente. «Há lá coisa mais bonita do que uma revolução.»